terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Da lama ao Rock

Chico Science
O Rock é conhecido pela transgressão e arrebata o ocidente juntamente com o imperialismo norte-americano. O Plano Marshall - medidas para financiar a Europa destruída na II Guerra - transformou os ianques em queridinhos. Justamente quando os EUA começam a ganhar notoriedade mundial, vem um ritmo com raízes negras e conquista o mundo. Fato inaceitável para a elite branca e conservadora, adepta da diferenciação entre negros e brancos. Independente desses, o Rock merecia respeito e isso veio com o tempo.

O Brasil ficou de fora do Plano Marshall (obviamente), por outro lado teve acesso a euforia do Rock. Se nos EUA o ritmo surgiu à margem da sociedade, no Brasil o Rock é adotado primeiro pelas camadas mais abastadas e, posteriormente, pelos demais segmentos. O ritmo é popularizado por Raul Seixas. Garoto baiano, branco, classe média alta e amigo dos funcionários da embaixada estadunidense. O resto, todo mundo sabe.

Na década de 1980, o Rock brasileiro chega à mídia. O processo de abertura política ofereceu um terreno fértil para o gênero. O fim do regime militar trouxe novas esperanças ao Brasil, a música - mais uma vez- segue a vida social. A sociedade buscava formas de exprimir o descontentamento. A efervescência do Rock atendia aos anseios de um país sufocado por duas décadas de repressão. Titãs, Legião Urbana, Ira! Ultraje a Rigor, anunciavam as mudanças - nem tão novas assim.

O BRock origina-se na classe média brasileira. Fenômeno que acompanha a vida social brasileira, da Independência até hoje. A pátria que nos pariu é carente de movimentos artísticos, políticos e culturais originados das massas. O Rock brasileiro trilhou o mesmo caminho. O BRock tem um aspecto positivo, quebrou a hegemonia da Bossa Nova. Nas palavras de Raul Seixas, “o Rock era graxeira - gíria atribuída às pessoas pobres, intelectual ou financeiramente” e a Bossa Nova, para pessoas ricas ou sofisticadas.

Na década de 1990, o BRock sofre outra reviravolta. O Nordeste entra em cena novamente. Pernambuco é o quartel-general do Manguebeat, movimento artístico originado em Recife. Chico Science, garoto pobre, nascido em Olinda e porta-voz dos mangueboys. Se Raul juntou Rock e Baião, Chico fertilizou o Rock com a estética do mangue. Maracatu, caboclo de lança, caranguejo.  Este são termos que passaram a fazer parte do Rock Brasil. Graças ao jardineiro do mangue, Chico Science e seu “bando”, o Rock Tupiniquim ganhou o mundo.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

E a semana passada?

Participantes d'A Semana de 1922 - sabiam ler
Chegou fevereiro e as demais consequências, carnaval, samba, suor e cerveja. Esqueçam o samba (já era) resta o suor, a cerveja e música de qualidade duvidosa. Estamos em 2012, efeméride - sempre quis usar essa palavra - importante para a vida artística nacional, a Semana de Arte Moderna, completará 90 anos. O evento aconteceu entre os dias 13 e 17 de fevereiro de 1922, organizado pela vanguarda artística da época. Villa-Lobos, Tarsila do Amaral, Mário de Andrade e outros, apresentaram novas propostas para arte brasileira. Música, Pintura, Escultura e Literatura (prosa e poesia) expostas usando roupas limpas, livres do academicismo e do ranço europeu.

A celebração recebeu financiamento da elite paulistana e provou, mais uma vez, a proximidade entre o capital e a arte. Claro que isso não é regra, e sim algo que pode ser observado ao longo da história. A Capela Sistina foi possível graças, também, ao dinheiro. Embora o trabalho de Michelangelo seja divino, o pintor tinha necessidades terrenas. Recapitulando, a Capela é o encontro das habilidades do pintor e da grana das organizações Vaticano.

O barulho de 1922 continua ecoando nos ouvidos da arte brasileira. Abordar este tema banal parece coisa de tolo ou impressionado, tem fundamento essa afirmação. A arte moderna é parte do nosso cotidiano, há quem fale em arte pós-moderna, mesmo que inexista uma vanguarda a carregar esta bandeira. Sempre que ouvimos falar n’A Semana, são sempre aqueles chavões repetidos acima. E esquecemos de perguntar quem consumia arte no Patropi daquele tempo.

O Brasil de 1922 é diferente daquele cenário mostrado n’A Semana. Vemos os artistas e intelectuais posando para foto do evento, vestidos de maneira impecável, banho tomado e demais apetrechos. A realidade da maioria dos brasileiros era outra, rico de privações. O contexto era bem cruel, existia um batalhão de analfabetos, impossibilitados de consumir a arte dos transgressores d’A Semana. As estimativas falam em 75% da sociedade na condição de analfabetos. A estética da vida real não era das mais bonitas

Se nos prendermos a forma mais acessível de arte, a Literatura. Acredito e tenho uma certeza, os escritores - involuntariamente ou sei lá - d’A Semana publicavam livros para ler em saraus organizados por e para eles. Leitura, na década de 1920, tratava-se de um prazer inacessível a maior parte da população. A “simplicidade” da arte escrita esbarrou no fantasma do analfabetismo. O que dizer das outras manifestações artísticas presentes na semana? A maior parte da sociedade brasileira ficou fora da festa, ainda hoje é assim. Arte ou feijão com arroz continuam artigos de luxo.